Morando no Interior

Daniela Haas Caruso Gomes

Aqui as ruas ainda são de paralelepípedo – e as crianças brincam descalças e se divertem mesmo assim. E os carros passam tranquilos e mostram que com um pouco de gentileza, faixas de pedestre não são tão necessárias assim.


Aliás, aqui, gentileza é um valor passado de pai para filho. E depois passado adiante. E ainda é alimentado aquele costume bonito de agradecer a um favor com objetos simples, seja um doce feito por você ou uma planta de seu jardim. Diz a lenda que, ao pegar uma travessa emprestada, a mesma não deve ser devolvida vazia.

 Domingo aqui é dia de descansar – até a cidade descansa. Então a feira, aquela bem tradicional que só funciona aos domingos, é a única fonte de comércio aberta (e só pela manhã). Aliás, vale lembrar que lá é o único lugar que vende doces tão gostosos quanto os que a sua avó fazia.

Aqui ainda existem casas de muros baixos e outras com cercas de madeira, enfeitadas por flores que cresceram sem que ninguém plantasse. Nos finais de semana, é comum encontrar algumas casas com a porta da frente aberta com a mesma tranquilidade que se manteria aberta uma janela. E prédios por aqui são poucos, por isso se vê bastante o céu.


Aqui as pessoas têm costume de se visitar pelo simples fato de estarem passando perto da casa de alguém. E mesmo aparecendo de surpresa e sem ligar, incrivelmente a hora que se chega é sempre uma boa hora e, na hora de ir, o dono da casa sempre diz “Ué, já vai? Mas ainda é cedo!”.

Vez por outra, quando uma casa não tem campainha, o problema é resolvido de forma simples: basta bater palmas aproximadamente três vezes e falar a famosa frase “Oh de caaasa!”. Se o dono da casa não estiver, sem problemas, o vizinho vai passar alguma pista de onde você pode encontrá-lo.

Aqui é possível criar contas em bares ou padarias, e nem é preciso levar comprovante de residência ou documento – basta dizer seu nome. Às vezes nem isso, porque a maioria das pessoas conhece você. Ou seus pais. Ou seus avós. Ou seu primo de quarto grau. 
Num raio de 30 minutos da sua casa, é possível chegar a pelo menos 3 cidades diferentes. E quando sair à noite por uma destas cidades, você vai acabar dormindo na casa do seu amigo que mora nesta cidade, ainda que você possa voltar para a sua. E só para constar, entende-se por: amigo seus amigos de infância, os amigos dos seus amigos e seu novo melhor amigo que você conheceu há exatos 15 minutos.

Por aqui, diversão aqui é uma equação que depende das seguintes variáveis: as pessoas, o humor das pessoas e a criatividade do grupo. E descobre-se que quando estes fatores estão favoráveis, a varanda do seu melhor amigo é suficiente para uma das melhores noites da sua vida.

A vida aqui é simples. E justamente por isso é tão boa. (: